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domingo, 4 de outubro de 2015

Um olhar atual do passeio de Manuel Quintino da Ribeira a Valbom - Uma família Inglesa


Sempre que Manuel Quintino empreendia um passeio, com o fim de se distrair, não hesitava na escolha do itinerário. Desde tempos imemoriais adotava um e nem lhe passava por o sentido modificá-lo. Deixava-se conduzir por o hábito nisto, como em tudo mais. Atravessava a cidade até à ribeira; seguia depois, pela margem direita do rio, até Campanhã; chegando ao Esteiro, tomava pela estrada acima, que o levava ao Jardim de S. Lázaro, e enfim recolhia a casa.
Foi o que fez naquela tarde. A cidade atravessou-a lidando ainda com o pensamento de tristeza, com que saíra de casa.













“ A primeira diversão operou-a só à vista do mercado de peixe, na ribeira.
As lanchas valboeiras tinham, naquele instante, chegado ao cais. As regateiras, os compradores particulares e os pescadores que vendiam, animavam o mercado com o movimento e vozearia.”








“Este espetáculo, cheio de vida comercial, não achou indiferente Manuel Quintino. Agradava-lhe aquele tráfego; examinava com olhos conhecedores a excelência do peixe, e informava-se curioso dos preços que regulavam o mercado. Ao sair dali, ia pensando:
(Manuel Quintino):
- Não há nada para o arranjo doméstico, como a pescada. É o peixe mais inocente que há. Com razão lhe chamam a galinha-do-mar. “



























































































“ Mais adiante, tendo passado a última casa, que lhe tolhia a vista do rio e a margem oposta, volveu naturalmente os olhos para o vulto escalvado e sombrio da Serra do Pilar, coroada pelo seu convento em ruínas e a sua igreja circular. Os tristes vestígios das guerras civis estão ainda naquele lugar muito evidentes, para que a lembrança delas não acuda súbita ao espírito de quem quer que o contemple por momentos”























































































































































“ Chegou à quinta chamada da China – um dos passeios favoritos das classes populares portuenses."









"Desciam a rampa, que antecede o portão, alguns bandos de gente do povo, rindo, cantando, em plena festa; iam em direção ao rio. As barqueiras de Avintes aproximavam os barcos da margem para os receber; outras, ainda a grande distância, chamavam, com toda a força daqueles pulmões robustos, as pessoas que vinham por terra. Cruzavam-se os barcos, movidos por vigorosos braços destas engraçadas e joviais remeiras, e carregados com os frequentadores das diversões campestres do Areinho e da pesca do sável. Tudo era riso e cantigas no rio."







Este ambiente bucólico e romântico sempre atraiu a atenção dos pintores do Porto. E se foi Aurélia de Souza, que aí viveu, quem melhor captou o espírito do lugar, neste texto iremos seguir, contudo, uma ordem cronológica para a melhor compreensão de algumas das imagens que se apresentam. 
Já no século XVIII, Jean Pillement  pinta uma vista do Douro no lugar do Areinho.



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fig. 1 Jean Pillement, (1728-1808) Margens do rio Douro 52 x 66 cm. Museu Nacional de Arte Antiga.

As tonalidades claras dão à composição uma encantadora poesia bucólica. As modelações do terreno e a colocação de figuras em planos distintos, garantem a profundidade de toda a composição e dão o pitoresco ao quadro. Na margem esquerda onde dormem na praia os barcos pescadores[  – os valboeiros que se distinguem pela sua proa empinada - três pescadores num pequeno morro atarefam-se na pesca fluvial junto a uma árvore, um freixo  que nesse lugar se ergue. O conjunto formado pelos barcos, pelo morro e pela árvore, fazem uma moldura que enquadra a paisagem do rio. Neste, sob uma luz matinal e um céu azul de poucas nuvens, navegam tranquilamente quatro barcos, onde se distingue um rabelo, de larga vella enfunada, e espadella longa e esguia estirando- se ao lume d'agua como a cauda de um cetáceo.  Na margem esquerda do Douro, a praia do Areinho tendo ao fundo a Quinta da Alegria. No canto inferior direito, um banco de areia onde um pescador está acompanhado de uma figura feminina que tem ao colo uma criança. Um cachorro reforça o ar tranquilo e familiar da paisagem.

http://doportoenaoso.blogspot.pt/2014/11/aquela-praia-na-curva-do-rio.htm

















































Como esta pobre gente vive satisfeita nesta vida trabalhosa do rio! … Ao vento, à chuva e sabe deus o que têm em casa para comer! E é um gosto como elas cantam e riem! … raparigas de quinze e dezasseis anos consola vê-las já a mover aqueles remos, que esfalfariam um homem, como eu. Não há como estes ares e esta vida do campo, para fazer as pessoas robustas!”







“Chegou ao ponto da margem, chamado Rego Lameiro. Aí opera o Douro uma das suas súbditas e surpreendentes transformações. Expiram as colinas fronteiras de uma e de outra margem interrompidas por um vale deliciosíssimo, onde a vegetação é mais abundante, mais povoadas as verduras, e onde se encorporam em riachos as águas escoadas dos próximos declives. Apreciam-se tão raros intervalos, em que o Douro, o severo Douro, sorri, como se aprecia um raio de alegria em rosto habitualmente carregado”


















“Neste sítio, alarga-se o leito das águas, diminui portanto a força da corrente delas, chegando, nas marés baixas, a permitir a formação de pequenas ilhotes de areia, para onde vão brincar as crianças dos pescadores. A tortuosidade das margens, furtando à vista o seguimento do rio, dá a este a completa aparência de um pequeno, mas pitoresco lago”










































Olhos descobrem, de um lado, o extenso areal de Quebrantões, ao qual sucedem prados e lezírias sempre verdes, veigas fertilíssimas, arvoredos espessos e, escondidas por o meio, as risonhas casas de algumas pequenas povoações campestres; adiante as Quintas da Pedra Salgada, e através do véu azulado da distância, a aprazível aldeia de Avintes; do outro lado o palácio do Freixo com seus torreões e balaustradas e as quintas e ribeiras de Valbom e Campanhã. E se é ao fim do dia, quando o sol doura todo o quadro, refletindo-se afogueado nas vidraças voltadas ao ocidente, e a viração da tarde enfuna as velas brancas das pequenas embarcações do lugar, e o céu é azul e as águas límpidas, a paisagem compensa bem os privados de gozar as belezas mais celebradas por viajantes e poetas, as análogas das quais só a nossa cegueira nos não deixa às vezes ver a dois passos da porta.
Era aqui que Manuel Quintino se sentava sempre durante alguns minutos, sobre uma pedra solta da margem.

Pedra Salgada














































“ – Como isto é bonito! – pensava ele – É que nem há outro passeio assim, nos arredores do Porto. E a tarde então tão serena e sossegada, que até se percebe daqui tudo o que se diz no Areinho. Se eu tivesse dinheiro, era onde comprava uma quinta. Chegando aos sábados, saía do escritório e metia-me num barco … ou a pé mesmo … Afinal era um passeio … é verdade que se viesse Cecília, sempre era longe. Ainda ela não se cansa … Não se cansa? …. Não se cansava …. Agora …”





“ Subia ele já a íngreme costeira, que levava do esteiro de Campanhã até ao sítio do Padrão”.










fig. 4 A. C. Lemos (?- c. 1833/43), Francisco Pedro de Arbués Moreira (1777-1843) Carta topographica das Linhas do Porto levantada pelo coronel Moreira ; novamente lythographada.
Na planta podemos ver assinaladas a Bat.a do Seminário, a Q.ta da China, a Q.ta do Freixo, e aBat.da Pedra Salgada




Webgrafia:

http://doportoenaoso.blogspot.pt/2014/11/aquela-praia-na-curva-do-rio.html